O Museu de Arte Sacra de São Paulo, equipamento da Secretaria de Estado da Cultura, inaugura Contrapontos, coletiva de site specifics com nove artistas que promovem interferências com as obras da exposição de longa duração da instituição e com o ambiente, exibindo lado a lado arte barroca e arte contemporânea, confrontando-as e criando novos significados. A realização dessa mostra dá continuidade à proposta do MAS/SP de abrir suas portas a propostas mais atuais no circuito das artes, o que leva o visitante habitual do museu a se deparar com novas experiências culturais e convida públicos diferentes a conhecerem a especificidades de seu acervo.

Para tanto, a curadora Nair Kremer convidou um grupo de artistas, sendo oito indivíduos e um coletivo, a criarem trabalhos com total liberdade, respeitando os limites do tombamento da edificação. O grupo visitou os espaços do museu e cada um escolheu uma sala das coleções para inserir suas intervenções. São eles: Alex Flemming, Geórgia Kyriakakis, Guto Lacaz, Luiz Hermano, Monique Allain, Núcleo de Arte-Educação do Museu de Arte Sacra de São Paulo, Renata Barros, Roberta Segura e Silvia Mharques.

Com extensa trajetória como artista plástica, a curadora Nair encara um novo desafio ao propor aos artistas o diálogo entre seus trabalhos e as obras e espaços do MAS/SP, deslocando o conceito tradicional de museu para um novo lugar. “Longe da lógica administrativa e da rotina, sua posição enquanto curadora é a de artista, e isso faz toda diferença”, como define a pesquisadora e escritora Berta Waldman.

Contrapontos é, em si, uma única obra de arte, formada por outras obras. Esse trabalho é composto não apenas pelo espaço do museu, as obras de sua exposição de longa duração e os site specifics desenvolvidos para a coletiva, mas a maneira como cada um desses elementos interagem. “No século XV, o pintor Piero Della Francesca já dizia que ‘mais importante que a pintura de um arcipreste é a relação dessa pintura com outra ou com outros elementos’”, diz Nair. É exatamente isso o que a curadora propõe nessa exposição.

Na sala Ourivesaria Sacra, Monique Allain, com sua obra “Réquiem”, questiona os valores tão bem guardados neste local e o fato de que um dia irão desaparecer. No mesmo ambiente, Alex Flemming insere vozes de outras religiosidades na figura de Iemanjá. Já na Benedito Calixto, Guto Lacaz comenta a pintura e sua reprodução – enquanto imagem normal, tridimensional e espectral – em um jogo óptico. Ali também, Geórgia Kyriakakis, com sua obra “EMPENO À TONA”, explora e entrecruza diferentes sentidos dos termos exposição, revelação e deformação.

Com destaques simbólicos e interativos do Jardim do Claustro, Roberta Segura nos leva a refletir sobre o estado de clausura voluntária e involuntária, respectivamente, das monjas e de uma moradora de rua. Luiz Hermano, por sua vez, inspira-se em um museu da Turquia e aciona no visitante o reconhecimento da arte bizantina, mas em um tempo novo, com novos materiais. Em uma das salas mais contemplativas, onde está a imagem de Nossa Senhora da Luz, Silvia Mharques constrói uma máquina de referências filosóficas e coloca em pauta nossa relação com “a luz do conhecimento”. Na Técnica Construtiva, a instalação “A flor da pele”, de Renata Barros, mostra a relação entre corpo e materialidade, em uma referência ao Santo Sudário.

A área externa, junto aos profetas, conta com a participação do Núcleo de Arte-Educação do Museu de Arte Sacra de São Paulo, que exibe a instalação interativa “Salvaguarda”. Este trabalho, já no próprio título, problematiza uma das funções do museu e faz um convite para o reconhecimento público de seu papel social.

Adicionam-se a Contrapontos performances, como “Sagrado Território”, de Miriam Dascal e Fabio Villardi, e a apresentação musical “Fabuloso adeus/ Mortal loucura”, do grupo Pato Preto.

Contrapontos inova em sua presença no MAS/SP por apresentar site specifics, verdadeira “arte ambiente”, que apresenta elementos que dialogam esculturalmente com o meio circundante. A obra produzida sinaliza sua própria tendência de se voltar para o espaço incorporando-o ou transformando-o. Nair Kremer exibe trabalhos conceituais, mas de fácil assimilação, vencendo o desafio de contrapor, com suas poéticas, o tradicional.

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